27/09/2016

FERNANDO ESTEVES

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 Passos Coelho, 
o cúmplice perfeito 
de José António Saraiva

O que José António Saraiva faz em "Eu e os Políticos" não é imoral, é bem pior do que isso: o seu livro - chamemos-lhe assim - é um triste tratado de amoralidade assinado por um homem capturado pela raiva e algemado pelo desejo cego de vingança em relação a duas pessoas que odeia: Emídio Rangel e Paulo Portas. Para consumar o crime, viola sem pudor conversas privadas que terá mantido com familiares dos seus alvos, ambos entretanto mortos. 

Para o disfarçar, estende a traição às fontes que durante mais de três décadas lhe confiaram segredos na convicção de que se encontravam perante um jornalista decente. Enganaram-se: quem conhece José António Saraiva sabe que ele é, há muitos anos, um alienígena solitário que habita num corpo estranho em que cérebro e umbigo se fundem, numa devassa egocêntrica que, se não fosse perigosa, era apenas ridícula.

José António Saraiva é um perigo porque há quem ainda o leve a sério. Pedro Passos Coelho, seu admirador declarado, comprometeu-se sem reservas a apresentar publicamente a sua vingança particular sem se dar ao trabalho de ler a "obra" – e isto dá-nos uma ideia do poder de sedução que o ex-director do Expresso ainda conserva. Ao associar-se a um livro assinado por um extraterrestre, Passos Coelho teletransportou-o para o mundo dos mortais. Deu-lhe existência real. E com isso criou um facto político impossível de ser ignorado pela imprensa. Quem não o percebe pouco sabe de política e nada entende sobre jornalismo.

Passos Coelho voltou atrás e todos dizem que isso lhe fica bem. Que o humaniza, por admitir o engano. E que o reabilita. Pois. Talvez fosse interessante perguntar a Paulo Portas - a quem Passos deve o facto de ter um dia sido primeiro-ministro deste país -, aos filhos de Margarida Marante e aos familiares de Emídio Rangel se pensam assim. É que há enganos que não são admissíveis. Pedro Passos Coelho é político há cerca de 30 anos. É um homem calculista, frio e cerebral – características que partilha com Saraiva – e sabe medir o alcance das suas decisões. Eu, que sou um crédulo, admito que Passos possa ter cometido esta rara leviandade de boa-fé. Mas aqui chegados, de uma coisa ninguém o livra: será ele quem ficará na memória dos agredidos como o cúmplice perfeito de José António Saraiva na concretização da sua lamentável mesquinhez. 

IN "SÁBADO"
21/09/16

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