25/11/2015

JOANA BARRIOS

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Gangues das redes

Muito recentemente, por causa de um estado de Facebook de um amigo que tem muitos amigos e opiniões que geram controvérsia, uma grande comoção assolou a nossa pequena comunidade de amigos em comum. Após muitos insultos e críticas e desamigamentos, o emissor da mensagem controversa emitiu um novo estado que fazia referência ao terramoto que provocara, dizendo de forma resumida que tinha muitos amigos cujas opiniões não partilhava na totalidade ou amigos cujos trabalhos não eram os seus favoritos, etc, e assentava este dicurso na bela ideia de pluralidade, ao que parece o mais tremendo disparate dos nossos tempos.

Dias depois, num evento relacionado com arte, uma grande amiga em comum comentou comigo algumas das ondas de disparate que se sucederam ao dito estado de Facebook. Ondas essas que incluíram telefonemas e dramas sem fim, aliados a desilusões e cismas dignos do séc. XVI.  Ela, uma das mulheres mais maravilhosas que conheço, pareceu-me agastada sobre a estupidez que se abatera naquela que é a nossa pequena comunidade virtual. Onde entre tantas outras coisas, trocamos ideias por amor à felicidade que é pensar um bocadinho mais adiante.

Voltei a pensar nisto da influência das redes sociais em sociedade há coisa de uns dias, quando ouvi António Luvalu de Carvalho falar sobre o caso de Luaty Beirão. Não quis acreditar.

As redes sociais são de facto um perigo. Pervertem a forma como nos relacionamos, para lá da estranheza que provocam aquelas pessoas que são nossas amigas nas redes sociais e não nos cumprimentam na rua, a um ponto que roça o absurdo.

Nas redes sociais somos emissores, daí que a posição em que nos colocamos enquanto sujeitos possa por vezes dar origem a grandes comoções. Ao emitir uma opinião ou simplesmente ao partilhar uma fotografia ou uma música, estamos sempre a entregar ao mundo um bocado daquilo que somos naquele exato instante. Para os nossos amigos, deixamos de ser amigos e passamos a partidos, a ídolos, a fontes oficiais. Somos os editores da nossa autobiografia em fragmentos, e isso tem vindo a parecer-me cada vez mais estranho. 

Porque é cada vez mais recorrente assistir a trocas de galhardetes, a projeções e frustrações sob a forma de comentários agressivos a emissões possivelmente poluentes, no entanto passíveis de ser deixadas para trás. O simples facto de fazer um like numa publicação suscita muitas vezes animosidades em terceiros. E quando sei que metade de uma comunidade está revoltada com uma opinião e contra as pessoas que apoiaram essa opinião, sei necessariamente que essa comunidade tem um problema com os seus ídolos.

Quando ouvi que António Luvalu de Carvalho, referindo-se à detenção, em junho, dos quinze ativistas sob a acusação de planearem um golpe de estado em Angola, teve em conta o acesso a meios de comunicação e a influência dos membros do grupo em redes sociais, soube que a situação em que as redes sociais colocam o indivíduo começa a ser perversa para o eu, bem com para a comunidade.

O que fazemos nas redes sociais não é como o que fazemos em Las Vegas, porque as redes sociais fazem com que todo o nosso rasto esteja arquivado e permanentemente disponível.

Mas será que antes das redes sociais os debates em mesas de café também se constituíam como perigo eminente? Ou a troca de correspondência?

Porque é que as redes sociais nos transformam simultaneamente em ídolos e ajudam a esbater a ideia de ídolo? É por nos colocarmos todos no mesmo patamar e sermos todos susceptíveis perante um like?

IN "SOL"
19/11/15

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