25/10/2015

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ESTA SEMANA NO
"DINHEIRO VIVO"
Real Companha Velha. Há 250 anos a
. produzir vinho do Porto por alvará régio

É de 10 de setembro de 1756 o alvará régio de D José I que institui a criação da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro. Uma das muitas que o Marquês de Pombal promoveu, no âmbito da sua política de fomento económico e de reorganização comercial do país, mas a única que hoje resta em atividade, conhecida por Real Companhia Velha, nome que se impos desde finais do século XIX (para se distinguir de uma outra, a Real Companhia Vinícola do Norte de Portugal, criada em 1889, para assegurar a promoção dos vinhos de mesa).

Defender e valorizar o vinho do Porto, através da regulação da sua produção e comércio foram as atribuições iniciais da Companhia. Mas não só. Cobrava impostos para o Estado, abriu caminhos, estradas e pontes na região duriense, fez o desassoreamento do rio, para permitir a descida dos barcos rabelos, e esteve na origem do ensino universitário no Porto, através da Academia Real da Marinha e Comércio que, por alvará régio de 1803, fornecia cursos preparatórios, instrução industrial e de exercícios de manobras navais. Foi transformada em Academia Politécnica em 1837 e, mais tarde, na Universidade do Porto.
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Embora nasça por alvará régio, o capital da RCV foi sempre privado e altamente disperso, como forma de permitir que a companhia tivesse capacidade financeira para intervir na Região Demarcada do Douro, comprando os vinhos aos lavradores e não permitindo que o preço baixasse excessivamente. Para Pedro Silva Reis, o atual presidente da companhia, "o maior desafio a que a RCV esteve sujeita foi o de resistir à pressão política da maior potência mundial à época". Não nos esqueçamos que o Marquês de Pombal promoveu a criação da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro precisamente com o intuito de limitar a preponderância dos ingleses no comércio do vinho do Porto.

Foi a partir de 1960 que Manuel da Silva Reis, pai do atual presidente da empresa, começa a comprar ações e fica com a maioria. Hoje, Pedro e Manuel, o seu irmão, têm 67,5% do capital, sendo que há 2% dispersos e uma participação de 30,5% que são propriedade da Casa do Douro, entidade que o Estado deu por exntinta e cuja liquidação está em curso. O que vai acontecer à participação? Está disponível para comprar? Pedro Silva Reis garante que a questão não faz parte das suas preocupações e que quando chegar o momento pensará no assunto.
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Com 535 hectares de vinha distribuídos por cinco quintas (Carvalhas, Cidrô, Aciprestes, Sibio e Casal da Granja) , onde dá emprego a 214 pessoas, a RCV exporta para mais de 40 mercados. De maior exportador de vinho do Porto, a Real Companhia evoluiu e hoje é o maior exportador de vinhos do Douro. Dos 22 milhões que deverá faturar este ano, 52% correspondem já a este segmento. "Houve uma enorme transformação do mercado nos últimos 40 anos e sentimos a necessidade de reposicionar a empresa para a fazer voltar a prosperar", diz.

Com o vinho do Porto "sujeito a uma pressão imensa de volume e de margem", a RCV decidiu ajustar a sua operação à dimensão das suas marcas próprias, abandonando as marcas brancas. "Há 20 anos, era uma questão de honra no setor não baixar o preço de venda do vinho do Porto - não é o preço de venda ao público, é o preço a que saía das empresas!, frisa - abaixo dos quatro euros. Hoje, a pressão é para que não baixe dos três. O mercado nacional, o holandês, o francês, são tudo mercados que deixaram de ser rentáveis. Tivemos de fazer um golpe de rins muito grande para manter a empresa rica e dinâmica", garante. "Tudo aumentou nos últimos 20 anos, os custos naturais, os custos de contexto no Douro, e o vinho do Porto tem os preços ainda mais baixos. Tivemos de nos centrar nas categorias especiais e nos mercados de nicho e apostar crescentemente nos vinhos do Douro como forma de sobrevivência", diz.

Com os vinhos do Douro a crescer 10 a 12% ao ano, Pedro Silva Reis admite que, dentro de uma década, ambos os segmentos de negócio possam ter o mesmo peso nas vendas da companhia. Mas Reis garante que a Real Companhia será sempre uma empresa de vinho do Porto. "A RCV segue o que poucos seguem, uma atividade modelar. O vinho do Porto que comercializamos resulta todo da produção própria. Não compramos uvas para 'Porto', temos algumas parcerias com alguns lavradores para apoiar o crescimento do nosso Porca de Murça", explica. E porque os métodos são os mesmos desde sempre, Pedro Silva Reis não resiste a gracejar: "O nosso ponto fraco é a inovação, fazemos o mesmo há mais de 250 anos!"

Mas é facil perceber que o percurso foi difícil. Além das alterações a nível de produto, em 2011, a empresa vendeu, por 21 milhões de euros, as suas instalações históricas em Vila Nova de Gaia ao grupo The Fladgate Partnership. Estas estavam dadas em contrapartida aos espanhóis da Proinsa, num negócio que trocas de participações cruzadas e a Quinta de Ventozelo, no Douro. Um negócio que acabou em divórcio e que levou a nova negociação, desta feita com os proprietários da Taylor's, que são, agora, senhorios da RCV e que aí continua a fazer o enchimento dos seus vinhos.
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Pedro Silva Reis atribui à "preserverança" dos seus antecessores, mas também à sua, a capacidade de ultrapassar as várias crises com que a Real Companhia se defrontou. E quanto ao futuro? "Estamos a começar a pensar o programa estratégico a cinco anos. Será com certeza pautado por um rigor de gestão financeira muito apertado. Mas agora que as coisas começam a aliviar um bocadinho, poderemos, eventualmente, considerar pequenas renovações de vinhas e investimentos pontuais em equipamentos", explica.

O empresário diz-se apostado em "continuar a lutar para defender o prestígio" do vinho do Porto, através de uma "política muito consciente e muito responsável", mas também em dotar a região de uma dinâmica reformista, que traga prosperidade, sem gerar assimetrias.

* Uma história Real com dois séculos e meio de existência

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