14/06/2015

ANA RITA GUERRA

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Apple Music:
o gratuito é mau, o barato 
é bom, inovação nem vê-la

Com o original nome de Apple Music, o primeiro serviço de "streaming" da Apple vai chegar a 30 de Junho. São 9,99 euros por mês, "streaming" e rádio online, acesso a todo o catálogo do iTunes, disponível para iOS este mês e em outubro para Android.

Isto significa que a marca está oficialmente no jogo que começou há sete anos, mais coisa menos coisa, quando uns rapazes na Suécia criaram um serviço de "streaming" de música chamado Spotify. Nessa altura, a loja iTunes vendia canções que nem pãezinhos quentes e Steve Jobs nunca deixaria dar cabo dessa mina de ouro por causa de experimentalismo.

Acontece que as vendas de música digital começaram finalmente a cair, sem nunca terem compensado a queda na venda de CD; entre toda a concorrência, desde Deezer a Rdio, Pandora, Play Music, Amazon Music e que tais, o Spotify tornou-se o standard da indústria. É o mais
bem-sucedido, com 60 milhões de utilizadores em todo o mundo e 15 milhões dos quais pagantes, ou seja, metade do mercado - que totaliza cerca de 30 milhões de consumidores a pagar por serviços "premium" de música.

É neste mercado cheio de gente que a Apple vai vender o seu peixe, e não está inteiramente garantido que cheire bem durante muito tempo. Qual é a grande revolução do Apple Music? Nenhuma. É verdade que oferece uma rádio com emissão ininterrupta, a Beats 1, liderada por DJs conhecidos, entre os quais Zane Lowe. Também dá para pôr os artistas em ligação com os consumidores (uma plataforma chamada Connect), mas isso não é nada que não haja hoje. Os vários serviços de streaming existentes no mercado são todos cópias uns dos outros, e o da Apple é mais um.

A grande diferença para com o Spotify, que para todos os efeitos é o alvo a abater, é que a Apple não oferece versão gratuita. Este é, aliás, o grande debate da indústria. Ninguém, que se saiba, absolutamente zero empresas, ganha dinheiro com streaming. O Spotify então espalhou-se de tal ordem no ano passado que os prejuízos quase triplicaram, para 162,3 milhões de euros. É o preço de crescer com base numa versão gratuita disponível em qualquer aparelho, tentando depois converter os utilizadores em pagantes. Pode-se argumentar que, a seu tempo, o modelo vai vingar. Ou pode-se aventar que nenhuma indústria consegue resistir tantos anos à procura do break-even.

Talvez a pérola desta apresentação da Apple no Worldwide Partner Conference tenha sido, na verdade, a versão familiar, que custará 14,99 euros para ser partilhada por seis pessoas. Isso diminui consideravelmente o custo por utilizador - dá qualquer coisa como 2,5 euros por mês - e vai ao encontro dos rumores de que a Apple queria que as editoras lhe deixassem lançar o serviço com um tecto mais baixo que os 9,99 euros standard. Nenhum serviço tem um pacote familiar tão generoso, e agora é saber se alguém vai seguir o exemplo para tentar ser mais competitivo, ou sequer se a jogada da Apple dá resultado.

Ter os primeiros três meses gratuitos também será importante para testar a adesão dos consumidores; prejuízo não é coisa com que a Apple, que tem 150 mil milhões de dólares em dinheiro no bolso, tenha de se preocupar.

A dúvida fundamental é esta: enquanto houver streaming on demand gratuito, será possível convencer um número suficiente de pessoas a pagar? Porque é que alguém irá trocar o Spotify gratuito pelo Apple Music pago? Aquilo que a Apple apresentou agora é simpático, mas não parece suficiente.

IN "DINHEIRO VIVO"
09/06/15

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