26/12/2014

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A GERAÇÃO ENRASCADA

O grande homem é aquele que não perdeu a candura da sua infância...

Pertenço a uma geração que teve de se desenrascar. Nasci ao som do rufar dos tambores da 2a Guerra Mundial. Os clarins e as sirenes faziam o toque de à rasca, anunciando mais um bombardeamento.

A Santa da minha Mãe, pariu-me de cócoras. Quando se sentiu à rasca, muniu-se da tesoura e do baraço e fez tudo sozinha. Chegou por casualidade uma vizinha e ajudou aos últimos preparativos, talvez um caldo de galinha velha, que era o prémio de qualquer parturiente. Hoje, as que se rotulam de à rasca têm seis meses de licença de parto. Essa vizinha, que durou cento e tal anos, passou a vida a contar-me isto, vezes sem conta. Aos miúdos, faziam uns calções com uma abertura na retaguarda, e, quando estivessem à rasca, baixavam-se, o calção abria e fazia-se em escape livre e, andava sempre arejado. Aos dezoito anos, ainda o comboio passava em Mirandela e tive o azar de fazer cargas e descargas dos vagões para os camiões. Os adubos vinham em sacos de 100 kg, as pernas tremiam mas tinha que me desenrascar. Os mais velhos sabem do que falo, o trabalho era duro incluindo as cegadas, mas.... fazia-se tudo a cantar.

A mesma geração, fez as três frentes da guerra colonial, morreram nove mil e quinze mil ficaram mutilados e a cair aos bocados, chamam-lhes Heróis, mas dizem desenrasquem-se. 

O 25 de Abril foi feito por essa mesma geração, bons líderes, povo unido e desenrascaram-se muito bem. Por fim, a debandada da emigração para toda a Europa, atravessando montes e vales íamos chegando a todo o lado. 

Vivíamos em contentores e barracas, o tacho onde se lavavam as batatas era o mesmo para se lavar o nariz, mas não nos desenrascamos nada mal. Depois veio a geração rasca. Drogas, rendimentos mínimos e vergonha de trabalhar. 

Agora, dizem ser a geração à rasca, querem ser todos Doutores, arrastam-se anos à volta dos cursos, os parques universitários estão cheios de carros de luxo, ficam por casa dos Pais até aos trintas e “quem aos vinte não é, aos trinta não tem, aos quarenta já não é ninguém”. São uns enrascadinhos, não querem assumir a responsabilidade de uma família, vagueiam de noite, dormem de manhã e a Mãe chama-os para almoçar. 
O Pai vai recheando a conta, porque um Pai é um banco proporcionado pela natureza. Eu não quero medir tudo pela mesma rasa e acredito muito na juventude, aconselho-os a que se caírem sete vezes se levantem oito, porque o Governo está à rasca, a oposição está enrascada e a juventude não se desenrasca. 
Os que cantam, Homens da Luta, é uma luta sem comandantes e o povo vencido jamais será unido. Façam pela vida... 

E, não estejam à espera que o mar arda, para comer peixe grelhado!... 

* Temos pena de não conhecer o nome do autor


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