20/06/2014

PEDRO SANTOS GUERREIRO

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Guerra sangrenta

É um momento histórico. Ricardo Salgado sai da liderança do BES. Não é uma cadeira que muda, é uma cabeça. Não é uma pessoa que sai, é um regime de poder. É uma saída forçada e ao mesmo tempo consentida pelo Banco de Portugal. É uma guerra que entra nas batalhas finais. A sucessão está por definir. Vazios de poder? Não existem. Antes de correr bem ainda vai correr mal.
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Como o Expresso Diário revelou, a guerra entre Salgado e Ricciardi está completamente extremada. Porque se um já aceitou sair, o outro não aceitou não ficar. E, sobretudo, Ricciardi não aceita que Salgado controle a sua própria sucessão, colocando a sua própria gente no leme que ele entrega. É isso que Salgado quer.
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Os cinco ramos da família Espírito Santo vão definir entre duas correntes que se confrontam. De um lado, Ricardo Salgado, que quer escolher Morais Pires para presidente da comissão executiva e ficar como presidente de um novo comité estratégico, um conselho não executivo mas que mantém Salgado "dentro". Ricciardi verá nisso uma absolvição de Salgado e, no fundo, uma derrota para si. Os três outros líderes dos ramos familiares desempatarão. Mas não custa antecipar: em caso de cisão, haverá duas listas a concorrer ao poder no BES. Até à assembleia geral, no final de julho, vão se matar uns aos outros. Não vai ser bonito.
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O maior risco é fazer do BES o que foi o velho BCP. Se a Morais Pires ficar como presidente executivo e Ricardo Salgado como presidente do comité estratégico, então Salgado vai mandar por interposta pessoa. É uma má solução. Como se viu no passado no BCP. O problema não é Morais Pires, que ainda agora liderou o aumento de capital do banco. O problema é Salgado, que tem de sair do poder. Mas sobretudo: porque ao lado há um monstro falido chamado Grupo Espírito Santo, onde uma auditoria encontrou irregularidades gravíssimas nas contas.
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O papel do Banco de Portugal é essencial. Tem sido. Ao longo do último ano, sem nunca levantar ondas públicas, o supervisor já isolou o banco dos problemas do grupo; já retirou o controlo do banco à família; e já forçou a saída de Salgado. Em troca, permitiu-lhe uma saída airosa: sair pelo seu próprio pé e não correr o risco de perder a idoneidade. 
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Ricciardi tem contra o apelido, o facto de ser arguido em processos judiciais e ter sido administrador da ES International. Mas tem outro fator, que é ao mesmo tempo a sua maior força e a sua maior fraqueza: o temperamento. Irascível, enérgico, é um homem inderrubável. Não vai desistir nunca. E isso é a sua maior força porque não desiste e a sua maior fraqueza porque o torna imprevisível. 
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Um consenso na família, que eventualmente passasse por terceiros nomes, é menos provável que uma cisão. Dentro da família. E talvez dentro do banco. O poder pode cair para qualquer um dos dois lados. Na rua o poder não cai. Mesmo que para lá arraste o banco. 
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Não vai ser bonito.

IN "EXPRESSO"
19/06/14


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