14/12/2013

XAVIER RODRIGUES MARTIN

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Econominha

Brincar com as palavras é uma forma amena de refletir sobre a essência das questões que nos absorvem e procurar soluções imaginativas e, às vezes, mais ambiciosas das que o pensamento canónico nos leva a produzir.

De jovem apreendi que muitos dos grandes filósofos são alemães porque a língua germânica tem uma grande flexibilidade para formatar conceitos complexos em novas palavras facilmente inteligíveis. As nossas línguas latinas, embora ricas em matizes sedimentados pela história, adoecem de um excesso normativo e processual que condiciona a capacidade de capturar o ritmo frenético da inovação e da mudança social e ficam, por isso, limitadas ao sequestro de palavras forâneas para evoluir ao ritmo exigido pela realidade que representam.

Nesse âmbito, as mudanças sociais e tecnológicas caparam a inovação lexical, dada a sua velocidade e transversalidade. Surpreende, no entanto, que a importância do factor económico na crise que atravessamos não se tenha traduzido numa maior dose de inovação nas formas de criar e distribuir valor e, consequentemente, na criação de novos conceitos e palavras nesse domínio. Em qualquer caso, é indiscutível que um dos efeitos da transformação do modelo económico europeu é a maior importância relativa da iniciativa individual para criar valor económico. Ou, dito de uma forma mais crua, a incapacidade dos Estados para garantir a cobertura das necessidades vitais dos seus cidadãos. Obrigaram-nos a privatizar a nossa economia e a transformar em "econominha".

Mas essa nova "econominha" encerra também elementos positivos. Acredito que estamos nas primeiras fases de um processo transformacional que, após ter empurrado muitos profissionais do mundo corporativo para o autoemprego, vai-se transformar, em múltiplos casos, em iniciativas empreendedoras mais sólidas que, após ganhar alguma tração, voltarão a convergir entre elas para juntar esforços e ganhar dimensão. E, à diferença de ciclos anteriores, serão o talento e a tecnologia, e não o capital financeiro, os elementos de colagem dessas iniciativas.

O mundo está cheio de bilheteiras disponíveis para deixar-se seduzir por coisas inovadoras e úteis. Cada vez há mais pessoas que deixam de chorar e começam a fabricar lenços de papel. Encontram um propósito que os apaixona e apostam na "econominha" para não ficar na "economesma".

IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
13/12/13

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