29/09/2013

DINIS DE ABREU

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O improviso como regra


O serviço público de televisão tem sofrido não poucos tratos de polé e entorses ao longo da sua atribulada existência e através de sucessivos governos. 

Terminado o regime monopolista, conviveu melhor ou pior com os novos operadores privados, ensaiou concorrência pura e dura, foi à luta, ganhou e perdeu, foi palco continuado de disputas como instrumento ideológico e político do poder do dia.

Com o actual Governo, a RTP já esteve para ser privatizada, no todo ou em parte, já se admitiu que fosse concessionada e, no mais recente modelo, continuando pública, passa a depender da fiscalização de uma ‘comissão de sábios’ . Entre as propostas de Miguel Relvas e as de Poiares Maduro cabe tudo, não tendo mudado o Governo nem o respectivo Programa. Nem o primeiro-ministro.

Ou seja: o mesmo Governo pode mudar de opção de fundo, relativamente ao operador público de televisão, com a mesma espantosa ligeireza que lhe permite lançar briefings diários com os jornalistas, logo a seguir suspensos, porque estavam a gerar «ruído desproporcional», segundo o piedoso acto de contrição de Pedro Lomba, ‘espantado’ com o funcionamento dos ministérios «como mini-Governos». Para um activo ex-blogger surpreende tanto desconhecimento.

Os ziguezagues da coligação, desde a famosa TSU aos malabarismos nos media do Estado, são deveras preocupantes, reveladores de impreparação ou de decisões tomadas em cima do joelho.
Diz o Programa do Governo nesta matéria: «O Estado deve repensar o seu posicionamento no sector da Comunicação Social, enquanto operador, tanto ao nível do grupo RTP como da Lusa (…). O grupo RTP deverá ser reestruturado de maneira a obter-se uma forte contenção de custos operacionais, já em 2012, criando, assim, condições tanto para a redução significativa do esforço financeiro dos contribuintes quanto para o processo de privatização. Este incluirá a privatização de um dos canais públicos a ser concretizada oportunamente e em modelo a definir (…)». 

A menos que o Programa do Governo seja um simples exercício de estilo para cumprir calendário, é intrigante que, volvidos dois anos, Passos Coelho tenha deixado cair a primeira bandeira, aparecendo agora silencioso perante o novo modelo defendido por Poiares Maduro, inspirado na estrutura da britânica BBC, sem qualquer menção à privatização anunciada. 

Na forja está agora uma nova e nebulosa entidade «genuinamente independente», de supervisão do serviço público de rádio e televisão, à qual caberá a escolha dos futuros gestores, recrutados mediante concurso público. Volta-se à estaca zero. É outro roteiro.

Está visto que o Executivo convive mal com o seu próprio Programa, nesta como noutras áreas sensíveis da governação, onde Passos Coelho se tem revelado tão categórico como errático, oferecendo de si, a meio do mandato, uma ‘imagem de marca’ pouco abonatória das suas certezas.

A RTP é um barco à deriva. Poiares Maduro, se quiser ser tutela, terá de repensá-la a sério, antes que as audiências, em acelerada curva descendente, deixem de ter qualquer utilidade como serviço público que o contribuinte suporta. Sem vislumbre do benefício.

IN "SOL"
24/09713

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