02/08/2013

ALBERTO CASTRO

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Irritações

Nos últimos tempos, houve coisas que me mexeram com os nervos. Partilho algumas. 

 Irrita-me, desde logo, a forma, entre o insolente e o incompetente, como a ministra das Finanças tem gerido o dossiê dos swaps. Já todos percebemos que a sua defesa assenta nas vírgulas e preposições do que disse, algo tanto mais ridículo quanto, num primeiro momento, tentou fazer do tema uma arma de arremesso contra o governo de Sócrates. Aprendiz de feiticeira terá, ao que parece, agradado ao chefe, que a promoveu, e tem pactuado com a forma amadora como o assunto tem sido gerido. Com as contas e finanças públicas a exigirem todo o esforço e atenção, irrita assistir ao prolongar deste folhetim que terminaria se houvesse a humildade para reconhecer o erro.

Como é hábito, a comunicação social vai mantendo a matéria em agenda, libertando informação à medida das conveniências. Faz o seu papel. Com frequência, os títulos, a puxar para o soundbite, pouco têm a ver com o conteúdo. Uma prática que cria hábitos. Maus hábitos. A certa altura o título é tudo. O fim-de-semana trouxe-nos mais um exemplo: o relatório do Tribunal de Contas sobre as PPP na saúde. Faltaria contabilizar uns 6 mil milhões de euros. Está lá dito. Como está, mesmo no sumário executivo, que esses cálculos ignoram uma coisa muito simples: se os tais serviços de saúde fossem prestados por outros meios, no caso, por hospitais de gestão estatal, haveria também custos a suportar, não sendo claro se seriam maiores ou menores. Não é isso que a notícia insinua e, estou em crer, não por incompetência. Numa altura em que se exige serenidade na discussão, esta busca constante do sensacionalismo primário, desinforma (serve a quem?) e radicaliza o debate, fazendo-o assentar numa base falsa. A persistência da prática, para além de irritante, é perigosa.

Como exaspera a cobertura desmesurada dada a qualquer ajuntamento, por menor que seja, desde que de contestação e, sobretudo, de promoção das causas ditas fracturantes. Vinte pessoas a insultar um ministro é notícia, como são dez carros a apitar contra as portagens. Enquanto presidente, Sampaio irritou-se com a cobertura dada aos boicotes eleitorais. Quando os media não apareceram, os protestos tiveram de encontrar formas legítimas de se exprimir. Não quero com isto dizer que não haja causas minoritárias que merecem divulgação e justificam notícia. Há muitas e boas, quase todas nos antípodas do exibicionismo encenado para uma comunicação social cúmplice ou bacocamente deslumbrada. Ainda se fosse só um fenómeno da silly season.

Sinal dos tempos, vai ser essa a estação durante a qual o Tribunal Constitucional (TC) irá emitir o seu parecer sobre as candidaturas de autarcas que completaram três mandatos noutra autarquia. Não percebo os argumentos do TC para terem adiado o seu pronunciamento. Formalmente, os doutos juízes terão, por certo, razão. Pouco me importa que essa demora ponha os nervos em franja aos putativos candidatos e, nem sequer, que venha a ter consequências partidárias. Afinal os partidos puseram-se a jeito. O que está em causa vai muito para além desse jogo. Aquela postura formalista desrespeita os eleitores e será mais uma acha na fogueira onde arde a democracia. Já não bastavam as tricas partidárias que impediram a Assembleia da República de se pronunciar. Faltava-nos o Tribunal Constitucional ajudar à festa. Arre!

Para acabar uma irritação menor. Um destes dias recorri ao transporte aéreo na ligação Porto-Lisboa. Depois de um voo de 35 minutos, depositaram-me no extremo do novo e ampliado aeroporto. Seguiu-se uma caminhada de uns 10 minutos, em que pude admirar a obra, e que desembocou em território conhecido: a parte onde o autocarro nos deixava e por onde se saía e continua a sair. Agradeço o cuidado da ANA com a minha saúde, facultando-me as condições para uma boa caminhada. Gostei das novas instalações. Mas, será que podem voltar à rotina anterior e deixar-nos mais perto da saída? A maioria dos que fazem esta ligação, num sentido ou no outro, prefere um serviço expedito ao passeio higiénico, mesmo que em ambiente requintado.

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
30/07/13

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