16/01/2013

DAVID DINIS

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Boa noite e boa sorte











O Governo teve tempo desde Agosto, aquando da quinta revisão da troika, para preparar o debate sobre o prometido corte de quatro mil milhões de euros. Até terça-feira limitou-se a ideias soltas, polémicas semânticas e, depois, um silêncio perturbante.

Perdeu-se aí a primeira oportunidade de discutir bem um assunto sério. Se iniciasse a discussão pela sustentabilidade da saúde pública e dos apoios sociais – face ao inevitável envelhecimento da população –, não vejo como o PSpodia fugir da conversa.

Agora, a um mês e meio da meta definida, o relatório do FMI caiu como uma bomba. Sendo válido do ponto de vista técnico, é explosivo do ponto de vista social e político. Simplesmente por isto: não é possível começar um país do zero. Nem desejável.

O impacto foi de tal forma que voltaram as lamentáveis divisões no Governo. A primeira é entre políticos e técnicos. Sobre isso, só vejo vantagens em que todos estejam no Executivo. Só é preciso que se coordenem, de uma vez por todas.

A outra divisão é, porém, muito mais perigosa. PSD e CDS têm na sua raiz identitária a necessidade de se cortar despesa pública. Ao contrário do que se passou com o aumento de impostos, nenhum tem razões para evitar um compromisso. Falhar aqui será não só o falhanço do Governo, mas também do compromisso de cada um deles com os seus mais fiéis eleitores.
TC e oposição

Leio o pedido de fiscalização do Orçamento entregue pelos socialistas e espanto-me. Toda a argumentação para que seja declarada a inconstitucionalidade do OE é baseada em contas que nem eu, que não sou economista, me recusaria a subscrever. Mas o pedido foi subscrito até pelo líder do PS.
Conhecendo o processo como ele foi, é fácil perceber como é possível aquela ligeireza. O documento começou por ser preparado na ala do PS crítica da direcção – sem apoio técnico correspondente ao nível económico. Ao invés, o trabalho político foi tão bem feito que o pedido contava já com mais de 30 deputados do partido. 

Foi aí, e só a meio do percurso, que a direcção tomou a decisão de se juntar. Condicionou a recta final, colando o pedido ao do Presidente para evitar riscos maiores. Mas sem os cuidados que merecia tal acto.
O resultado é mau, pelo que revela os problemas com que se depara o principal partido da oposição. Mas mostra mais: o risco que é deixar a juristas, mesmo que muito qualificados, uma decisão tão complexa do ponto de vista financeiro. 

Dito isto, oxalá no Palácio Ratton existam assessores económicos à altura do momento (e da situação do país). Até porque este ano eles vão ter nas mãos o essencial da construção de um Orçamento. Vão ter que julgar o aumento de impostos, vão ter que julgar os cortes na despesa. E vão ter que pesar a dependência de Portugal do financiamento externo. É claro que a decisão é jurídica, mas aquele documento é o Orçamento de Portugal. 

Tudo isto lembra-me o título de um belo filme: «Boa noite, e boa sorte!».


IN "SOL"
14/01/13

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