30/01/2013

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HOJE NO
"DIÁRIO DE NOTÍCIAS"

Santana Lopes surpreendido com documento de ex-adjunto jurídico 

 O provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Pedro Santana Lopes, foi surpreendido pelo Ministério Público, esta quarta-feira, no julgamento da permuta dos terrenos da Feira Popular pelos do Parque Mayer, quando percebeu que Remedido Pires, o seu ex-adjunto jurídico quando presidiu à Câmara de Lisboa, elaborou um esboço do negócio que provocou a queda do Executivo municipal em 2007.

Na terceira sessão deste processo, no "Campus da Justiça", em Lisboa, ao ex-presidente da Câmara da capital [2002-2004 e alguns meses de 2005] foi mostrada uma proposta "muito bem elaborada" - segundo palavras de Santana Lopes -, que estabelecia as bases da permuta entre o município e a empresa Bragaparques, detentora do Parque Mayer, sem que Pires tivesse sido mandatado para o fazer.
Remédio Pires é um dos seis dos arguidos que respondem por várias infracções de normas legais no exercício das suas funções, além de Carmona Rodrigues, ex-presidente da Câmara (2004-2005, durante a ausência de Santana, e de 2005 a 2007), Fontão de Carvalho, ex-vereador das Finanças, Eduarda Napoleão, ex-vereadora do Urbanismo, e ainda dois técnicos municipais, Rui Macedo e José Azevedo.

Esta quarta-feira de manhã, a perplexidade do social-democrata surgiu depois de ter garantido, ao longo de mais de duas horas de declarações muito intensas, que, quando saiu da autarquia em 2004, para rumar ao Governo, deixou o processo estagnado e apenas com a indicação que ou se avançava para a expropriação do Parque Mayer ou o município optava por um fundo imobiliário.
O QUE RESTA DA FEIRA

"Num ano e meio, elaborou-se uma proposta, que foi sendo acompanhada pela Bragaparques. De um lado, tínhamos 45500 metros quadrados em Entrecampos (Feira Popular), do outro 46500 metros quadrados do Parque Mayer", lembrou Santana Lopes sobre a primeira tentativa de permuta entre a empresa liderada por Domingos Névoa e o município, ainda que então o próprio autarca se mostrasse desconfortável com aquilo que quando chegou à Câmara "se mostrava uma prática muito corrente, que era o recurso às "Operações Y" (permutas)".
Porém, já depois da proposta de acordo ter sido aprovada em reunião camarária e pela Assembleia Municipal, Domingos Névoa terá dado o dito por não dito. "Faltou ao respeito à Câmara de Lisboa, quando acompanhou todo o processo. A minha primeira reacção: vamos expropriar estes senhores e vamos revogar o que se aprovou", prosseguiu Santana. "Era o que me apetecia desde o início (expropriar). Se há terreno que deveria ser público era aquele", acrescentou.
A recuperação do Parque Mayer nas suas funções culturais era uma das promessas eleitorais, nos finais de 2001, quando o PSD ganhou o município ao PS, liderado por João Soares. Mas Santana Lopes admitiu hoje desconhecer o alegado imbróglio em que se encontrava a propriedade e os planos para o local.
"Assim que fui eleito, o Domingos Névoa apareceu-me no gabinete, mas não reuni sozinho com ele. Aliás, procurei nunca receber promotores sozinho. Ele contou-nos como tinha sido contactado pela Câmara anterior (PS) para contratar o arquitecto Norman Foster (autor de uma polémica torre de 25 metros para o Parque Mayer), por causa de um projecto do João Soares", explicou.
Daí que, a primeira tentativa foi a de chegar a um acordo com o empresário especializado em parques de estacionamento. "Não havia nada assinado, apenas coisas apalavradas, como, pelos vistos, era habitual. Posso dizer que o meu antecessor (João Soares) foi ao lançamento da primeira pedra do novo Estádio da Luz sem haver um único papel assinado entre o clube e o município", adiantou.
Quando se lançou mãos à informação disponível ter-se-á descoberto determinados cenários que pareciam não serem possíveis em 2002: "tanto a Feira Popular como até a área do edifício da Câmara (em Entrecampos) não estavam em nome da Câmara Municipal de Lisboa".
"Havia até um hectare no terreno da Feira Popular que tinha sido cedido pela Câmara 60 anos antes ao Ministério das Finanças, para a construção de uma central de camionagem", revelou, adiantando que diligenciou junto da então ministra de Estado e das Finanças, Manuela Ferreira Leite, o retorno do terreno à posse do município.
Segundo o ex-presidente da Câmara, a recusa de Domingos Névoa quanto àquela primeira permuta surgiu nas vésperas da saída de Durão Barroso da liderança do Governo. E por ali terá permanecido o processo. Daí a surpresa de Santana Lopes quando esta manhã o Ministério Público o confrontou insistentemente com um documento, apreendido em 2007, no gabinete de Remédio Pires, onde o ex-adjunto elaborava uma extensa proposta a apresentar à Bragaparques.
Mais: no mesmo documento aludia-se a uma alegada reunião entre o então presidente da EPUL, Sequeira Braga, e Domingos Névoa, que terá contado com a participação de Remédio Pires, sem que Santana Lopes tivesse tido conhecimento de tal.
Santana Lopes, que continuará a ser ouvido na próxima quarta-feira, 6 de fevereiro, concluiu as suas declarações quando se preparava para relatar o contacto que teve com a permuta dos terrenos quando regressou à presidência da Câmara, após uma permanência no Governo.
Aliás, foi partir desse momento, a 14 de Março de 2005, que Santana - de acordo com a acusação - terá sido confrontado com um negócio, de que depois recusou assumir a autoria, remetendo quer para Carmona Rodrigues, quer para Fontão de Carvalho a defesa de tal permuta.
O PARQUE

Naquele meio ano, e antes de se chegar à permuta com a Bragaparques, já como presidente, Carmona ainda propôs ao Executivo, em Outubro de 2004, a transferência dos terrenos da Feira Popular para a EPUL, que em contrapartida deveria ceder os espaços culturais a construir no Parque Mayer, com base num projecto do arquitecto Frank Gehry, que substituiu Norman Foster.
O social-democrata terminou o seu testemunho quando lembrava o regresso à Câmara. "Senti que era a minha obrigação. Nessa semana saíram várias notícias de que os funcionários municipais nem queriam que regressasse, que não gostavam de mim....", contou, perturbado, Santana, recusando lembrar alegados problemas que ocorreram entre si e Carmona Rodrigues, quando este teve de descer ao lugar de vice-presidente, e com toda uma máquina municipal que tinha sido reformulada pelo segundo.
Porém, o ex-primeiro-ministro fez questão de lembrar que Carmona (que entrou nas listas vencedoras do PSD por Lisboa em 2001, mas que Durão Barroso foi buscar para ministro das Obras Públicas em 2002), apenas foi presidente de Câmara na sua ausência porque assim o quis. "Ele (Carmona Rodrigues) quando foi para ministro pediu a renúncia do mandato na Câmara. Fui eu que lhe disse que deveria apenas suspender. Mas sem imaginar o que aconteceria mais tarde", explicou.

 *  Nós é que nos surpreendemos com o sr. Provedor surpreendido

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