30/01/2013

ANTÓNIO TAVARES TELES

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Bitaites
Opus Dei e Opus Night

1. Em entrevista à "Sábado", Henrique Raposo afirma (sem rir) que "não há uma relação de causa-efeito entre a ditadura salazarista e o atraso português". Acrescentando: "E não sou eu que o digo, são os números que o provam. Em 1970, 71 e 72 registaram-se taxas de crescimento chinesas".
Ponto um: é preciso ver donde vínhamos (tal como os chineses, de resto): de um extremo atraso, de uma extrema penúria.
Ponto dois: a que ficou a dever-se esse crescimento? Às remessas de milhão e tal de emigrantes, é claro, que mandavam o que conseguiam poupar (e era quase tudo do que ganhavam) para a "santa terrinha". Ora assim, também eu ...
Ponto três: os anos que HR cita (como provas) já não são propriamente do salazarismo, mas do caetanismo. O que, apesar de tudo, não é exactamente a mesma coisa. Mas defender Salazar foi, que ele o admita ou não, a sua "missão". Ou, se quiserem, a sua omissão. Só que não precisava de omiti-lo.

2. Opus Dei (e já não lhe chamo uma "seita secreta", como outros lhe chamam) é o poder e o dinheiro, obras de Deus, pelo visto ... Pelo que já estou como um célebre advogado desta praça (cujo sogro pertencia à Obra), que ao chegar a casa tarde e a más horas, encontrou o sogro, que saía para o trabalho. O sogro: Não tem vergonha? Ele, de pronto: Que quer, o senhor é da Opus Dei, eu sou da Opus Night. Boa malha.

3. Duas excelentes fotos no "Público" do dia 26. Uma, ilustrando uma matéria sobre a Universidade Católica, a outra sobre Lance Armstrong. Duas excelentes fotos - que digo- duas excelentes obras de arte.

4. Desde 1978, sempre tive cães. Aliás, cães e gatos. Mas vamos aos cães: uns extraordinários companheiros e, para quem fala com eles como eu falo - como se fossem gente - uns espantosos interlocutores, porque compreendem tudo o que se lhes diz, para além de compreenderem igualmente os movimentos, os gestos, os timings, quase até diria as intenções do amigo com quem vivem e que, bon gré, mal gré, é o líder, tem de sê-lo. Sobretudo quando se trata de um cão grande, de matilha (um pastor alemão, por exemplo, ou uma pastora alemã, que é o que tenho agora) Mas não o "dono", o líder. E, desde o primeiro até este último, ou esta última, todos me trouxeram idêntico conforto e idêntico prazer, que procuro devolver-lhes na medida da minha amizade e ternura por eles. Aliás, tirando o entra, o sai, o pára, o espera, o junto, o larga, o muito bem e o muito mal, nunca lhes ensinei nada: eles sabem. E no fundo todos me conheceram e conhecem muito melhor até do que a maior parte dos meus amigos. Por outro lado, acho que, salvo algumas consanguinidades perigosas, quero dizer, alguns cães que, por excesso de consanguinidade, são talvez inatamente desequilibrados e agressivos, nunca conheci nenhum que o fosse sem que esse desequilíbrio e agressividade não lhe tenham sido praticamente "impostos", não pelo pai ou pela mãe, mas pelo chamado "dono". O que não me impede de ter ficado com os cabelos em pé quando, a propósito de um ataque de um pitbull a uma criança, li (numa matéria da revista do "Público" sobre o tema), da boca de uma senhora que se considera "mãe dos (seus) cães" e é contra o abate do referido pitbull, que "é tão triste a morte da criança como a do cão"; e que, no caso de ter de escolher entre salvar um desconhecido ou o seu cão, escolheria "salvar o seu cão"! Porque - vamos lá ter juízo - há que ter a noção das proporções e um cão, por muito que se goste dele e ele goste de nós, não é uma criança, muito longe disso. E digo-o, mesmo sendo eu próprio contra o abate do animal. Mas, repito, há que ter noção das proporções. 
PS. Um dia, há muitos anos, ia eu com o meu pai a caminho das Minas de Jales quando, de súbito, um homem de uns 60 e tal anos, armado de uma caçadeira, saltou da berma para a estrada e meteu-se à frente do carro. O meu pai parou e perguntou-lhe o que é que se passava. Respondeu-lhe o homem: Olhe, já vi que não é o senhor que eu procuro, mas o que se passa é que, há uns dias, um fulano passou por aqui e, de propósito, atropelou o meu cão, matou-o e fugiu. Ora, eu estou à espera que ele passe por aqui outra vez, para matá-lo. Para vingar o cão? Para punir o acto, em boa verdade miserável, do automobilista assassino? Não sei. Mas lá que o homem estava ali para fazer justiça, mesmo errada, pelas próprias mãos, isso estava. E, se o dito automobilista ali voltou a passar, mesmo que tenha escapado com vida, levou com toda a certeza para contar, e a sério. Moralidade? Nenhuma, é claro, esta é apenas uma história de vida. Mas lá que fiquei com muito mais simpatia pelo "dono" do cão do que pelo automobilista, isso fiquei.

5. Mais umas prosas sobre Israel na imprensa portuguesa. E, de repente, revejo o tempo em que os dirigentes desse país se chamavam Shimon Pérès, Yitzhak Rabin, e sinto uma enorme nostalgia ... (Ah, o Yitzhak Rabin foi assassinado por israelitas da laia do senhor Naftali Bennett e Shimon Pérès continua vivo, vá lá saber-se porquê).

6. O Sporting não ganhou ao Guimarães mas já está sem dúvida a jogar muito melhor, com os centrais a perceberem finalmente como devem funcionar, com um bom lateral (Luisinho) e outro (Miguel Lopes) apenas suficiente, um excelente médio defensivo (Rinaudo), um bom médio de cobertura e até de ataque (bom remate à distância) de seu nome Adrien, três putos com jeito no ataque (um deles é mesmo um craque - Carrillo), só lhe faltando, e com urgência, um médio ofensivo já não digo da qualidade de um Lucho, um Aimar, um Deco, mas lá perto: maduro, criando espaços, fazendo o último passe e susceptível até de marcar golos. Se conseguir algo parecido, Jesualdo fica bem. Se não, terá ainda muito mais trabalho pela frente.

7. Treinadores-"sensação", esses sim, mesmo sensação: Marco Silva (do Estoril) e sobretudo Paulo Fonseca, do Paços de Ferreira.

8. Bom jornalismo no "Público" (a propósito dos resultados da Liga espanhola: "Hat-trick de Ronaldo pela manhã, 'póker' de Messi para acabar a tarde". Jornalismo assim-assim, d' "O Jogo": em destaque, "Furacão Ronaldo"; e, praticamente sem destaque nenhum, "Messi marca quatro golos e chega aos 200 na Liga". Mau jornalismo ("Correio da Manhã"): "CR7 dá mais um recital". Referência ao Barcelona-Osasuna ou a Messi: zero.

9. Vão bem as coisas, para os meus clubes: FC Porto na frente, embora com o Benfica à ilharga; Manchester United na frente, igualmente, tal como a Juventus e o Bayern; o Ajax apenas a 1 ponto do líder (Twente) e o Marselha a 3 (do PSG). Nada mal.

10. Grande matéria (na "Sábado") sobre Mourinho. Uma matéria no entanto séria, apesar de publicada num órgão de comunicação português onde, quando se trata do caro Mou, é tudo elogios, lambe-botices, patrioteirismos pegados. Alguns extractos agora, retirados de afirmações sobre o auto-proclamado "special one": "Mourinho é um inimigo do futebol"; "Nos dois anos em que esteve em Itália insultou toda a gente"; "Mourinho é um canalha"; "É um bebé chorão"; "Devia levar um murro nos dentes"; "Está a destruir o futebol espanhol"; "É o típico personagem que se poria em fuga depois de causar um atropelamento"; etc. etc. etc. Ah, e Beckenbauer: "Lá porque usa fatos de caxemira não deixa de ser uma pessoa rude"; e German Burgos: "Arranco-lhe a cabeça". Belo retrato!

11. Voz-off: "A troika fez uma avaliação péssima da situação portuguesa" (João Ferreira do Amaral).


Bicuaites


1."Público": "Ministério das Finanças falha avaliação ao plano de resgate da Madeira".É o velho silogismo: Gaspar falhou todas as avaliações, avaliou a Madeira, logo falhou também. Tinha de ser. Ou então a lógica dedutiva seria uma batata.

2. "Correio da Manhã": "Governo altera tabela dos salários".Para cima ou para baixo? É a pergunta a mil euros ...

3. Voz-off: "O regresso aos mercados é um trunfo para Portugal e um não-acontecimento para os portugueses" (Fernando Madrinha).

4. "Expresso": "Relvas: 'Privatização da RTP não será nesta legislatura'"."Público": "Um compêndio de asneiras". Acrescentar o quê?

5. "Público": "Ministério da Defesa confirma pedido dos chefes militares para mais 5 mil promoções".
De facto, com a guerra aí à porta ...

6. António José Seguro: "Sou o líder de todos os socialistas".
Ou mais ...

7. "Correio da Manhã": "Sócrates manda Costa avançar".
Sócrates: Avança!
Costa: Mas eu ...
Sócrates: Avança, é uma ordem!

8. Fernando Seara, ao "Diário de Notícias": "Estarei com os pés e a cabeça em Lisboa".
É quase a mesma coisa ...

9. Ainda Fernando Seara: "Digo-o aqui: eu não quero ser líder do PSD. Comigo, estão descansados".
Uff! (Suspiro de alívio vindo da São Caetano).

10. Luís Filipe Menezes: "Quero receber votos da direita conservadora à esquerda radical".
Uns votitos aqui, outros ali ...

11. "Expresso": "Nova lei apaga três freguesias em Barcelos".
É, parece que os ânimos estavam muito incendiados ...

12. Henrique Raposo: "Salazar não promoveu a ignorância".
Atenção, não confundir analfabetismo com ignorância: o analfabetismo (mesmo que só com a 3ª ou 4ª classes), pode passar, a ignorância (mesmo com a 3ª ou 4ª classes) fica.


"La casada infiel" 
de Federico García Lorca

Y que yo me la llevé al río
creyendo que era mozuela,
pero tenía marido.
Fue la noche de Santiago
y casi por compromiso.

Se apagaron los faroles
y se encendieron los grillos.
En las últimas esquinas

toqué sus pechos dormidos,
y se me abrieron de pronto
como ramos de jacintos.

El almidón de su enágua
me sonaba en el oído,
como una pieza de seda
rasgada por diez cuchillos.
Sin luz de plata en sus copas
los árboles han crecido,
y un horizonte de perros
ladra muy lejos del río.
........................................
Aquella noche corrí
el mejor de los caminos,
montado en potra de nácar
sin bridas y sin estribos.
No quiero decir, por hombre,
las cosas que ella me dijo.
La luz del entendimento

me hace ser muy comedido.
Sucia de besos y arena
yo me la llevé del río.
Con el aire se batían
las espadas de los lírios.
Me porté como quien soy.
Como un gitano legítimo.

La regalé un costurero
grande de raso pajizo,
y no quise enamorarme
porque teniendo marido
me dijo que era mozuela
cuando la llevaba al río.

IN "EXPRESSO"
29/01/13


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