17/01/2012



HOJE NO
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Marinho Pinto. 
“O Ministério da Justiça está 
a ser usado para ajustes de contas”

De acordo com a Ordem dos Advogados, apenas 2238 processos estavam irregulares e não 17 423, como revelou a auditoria do ministério

“Maçãs podres.” Foi esta uma das imagens mais usadas por Marinho Pinto, bastonário da Ordem dos Advogados, para acusar o Ministério da Justiça de ter agido com “má-fé” e “leviandade” na divulgação dos números da auditoria ao apoio judiciário: “O propósito era apurar as maçãs podres que havia no acesso ao direito e expulsá-las. Não esperávamos que o Ministério da Justiça pegasse nessas maçãs podres para enxovalhar todos os advogados”, protestou ontem o bastonário, antes de apresentar os resultados do relatório feito pela Ordem, tendo por base a anterior auditoria do Ministério da Justiça que pintou um retrato negro do apoio judiciário em Portugal, com relatos de irregularidades e fraudes que teriam custado ao Estado mais de meio milhão de euros.

Nesta guerra dos números, nenhum bate certo. O ministério de Paula Teixeira da Cruz falou de 17 423 irregularidades em processos. A Ordem foi averiguar e diz ter encontrado apenas 2238 processos com irregularidades, o que representa apenas 12% do total de processos irregulares que o ministério enviou para a Procuradoria-Geral da República.

Em 2885 casos, a Ordem encontrou desconformidades que não classifica de irregularidades, porque não tiveram qualquer impacto no pagamento de honorários. A razão por que Ordem e tutela tinham concordado em fazer uma auditoria era precisamente para averiguar irregularidades nos pagamentos aos advogados oficiosos mas, de acordo com Marinho Pinto, algumas das irregularidades denunciadas pelo Ministério da Justiça diziam respeito, afinal, a advogados que cobravam menos honorários do que aqueles a que teriam efectivamente direito. E 8028 processos do universo denunciado pela Direcção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ) estariam, afinal, regulares, tendo sido mal contabilizados por funcionários judiciais “sem conhecimento da lei” e que “cometeram erros gravíssimos”.

Juízes fugiram, advogados pagaram Para que não restassem dúvidas, Marinho Pinto seguiu o método de Paula Teixeira da Cruz e ilustrou os números com exemplos: sempre que os advogados escreveram ter feito duas sessões de julgamento quando afinal só fizeram uma, a auditoria do ministério classificou-o de irregularidade. Mas sem razão, explica o bastonário, porque “a remuneração prevista por processo inclui sempre duas sessões”: ou seja, fazer uma ou duas representa, em termos de honorários, exactamente o mesmo.

Mas há exemplos mais caricatos: no Tribunal Judicial de Oeiras, um juiz que prestava serviço no 1.o, 2.o e 3.o juízo criminais terá saído do país sem depositar as sentenças na secretaria — por essa razão, os julgamentos tiveram de ser repetidos. Como ninguém averiguou, os advogados ficaram com o ónus da culpa e os seus processos com o carimbo de “irregulares”. “Aqui o erro aconteceu por falta de cumprimento de uma obrigação legal do Estado e não dos advogados” que fazem o patrocínio oficioso.

Continuando nos confrontos dos números, Marinho Pinto rematou que apenas 309 advogados – e não 1035, como na auditoria do ministério – tinham todos os seus processos irregulares, indiciando prática de fraude. Outros 1623, porém, não tinham cometido sequer uma irregularidade. A Ordem não fez as contas a quanto dinheiro terão esses 309 advogados recebido indevidamente, porque diz não ter “condições para fazer essa contagem”, mas já remeteu todos os documentos para o Instituto de Gestão Financeira.

contra-ataque Sobre as contas apresentadas em Dezembro pela ministra Paula Teixeira da Cruz – e que falavam de um Estado lesado em 500 mil euros, depois de numa fase preliminar se ter apontado para 8 milhões de euros em prejuízo – Marinho Pinto disse serem “um exemplo esclarecedor de leviandade do ministério”. “Mesmo com os números errados apresentados pelo ministério, havia ali um empolamento de 230 mil euros porque as contas foram feitas com leviandade, com propósitos enxovalhantes”, acusou o representante dos advogados.

Marinho Pinto não hesitou sequer em dizer que os resultados da auditoria do ministério tinha “fins políticos claros. Há preocupações em usar o Ministério da Justiça para fazer ajustes de contas. Quer--se enxovalhar publicamente uma classe a quem se atribui o crime de ter escolhido uma pessoa para dirigir a Ordem”, disparou o bastonário numa clara alusão à derrota de Paula Teixeira da Cruz na candidatura a bastonária da Ordem dos Advogados, em 2004.

Processos A DGAJ reagiu aos dados apresentados ontem pela Ordem, acusando-a de não ter respondido em “tempo oportuno” às “constantes comunicações”, entre Setembro e Novembro. Sobre os números divergentes entre uma e outra auditoria, a DGAJ admite que os resultados da Ordem “se baseiem, essencialmente, em informações prestadas pelos advogados intervenientes e não pela consulta dos processos”. Mas Marinho Pinto negou-o: terão sido ouvidos os visados e consultados os processos em causa.

Questionado sobre qual o destino dos 309 advogados apanhados sistematicamente em situações irregulares, o bastonário prometeu respostas para depois dos resultados dos inquéritos da Procuradoria-Geral da República. E voltou a usar a imagem das maçãs podres: “Aqueles que se comprovar que traduzem fraude serão perseguidos impiedosamente pela Ordem. As maçãs podres são para sair.”


* Parece a Guerra das Rosas, quem fará de Dany de Vito?

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