12/12/2011

INÊS TEOTÓNIO PEREIRA


Estou sem rede

Os filhos não são brinquedos, não se escolhem, não se trocam, não se aperfeiçoam nem se devolvem. Muito menos funcionam com pilhas e nunca, nunca trazem livros de instruções. E é isto que torna esta tarefa de pai e mãe tão ingrata, difícil e imprevisível. Os filhos, lá por serem nossos, não nos pertencem; somos nós que os alimentamos, educamos e sustentamos mas, por junto, é só para isso que servimos. De resto, eles são eles e desenvolvem-se, crescem, pensam e sentem apesar de nós. E quando já não são educáveis, sustentáveis e alimentáveis, deixam de ser nossos. Os filhos, ao contrário da dívida da casa, não duram uma vida. Duram apenas uns aninhos e não há qualquer garantia de que fiquem nossos.

E o que resta então ao fim desses anos de sustento e dedicação? Resta uma ligação. No fim é esta ligação que conta: depois de milhões de litros de leite consumidos, de dias e dias de explicações, de milhares de ordens e de noites sem dormir, é só isso que resta. Uma simples ligação.
Ora, como eles são todos diferentes, e alguns muito difíceis de conhecer, esta ligação tem vários níveis de consistência. Um pai ou uma mãe pode passar uma vida toda sem conhecer o seu filho, sem imaginar o que ele está a pensar ou prever o seu comportamento. E, nestes casos, é preciso um esforço racional para criar uma relação. Não é para gostar, é para interagir. Os filhos gostam sempre dos pais e os pais quase sempre dos filhos, mas nem todos se dão entre si. Tal como o telemóvel ou a internet, é preciso manter compromissos ao final do mês e ver se há rede. Ou ficamos sem ligação.


IN "i"
09/12/11

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