18/02/2011

SOFIA GUEDES VAZ






Crescer ou não crescer, eis a questão

Quando não vemos uma saída para determinado 
problema, em vez de ficarmos no mesmo sítio 
à procura de uma solução inexistente, 
o melhor é mudar de lugar.

Alice no País das Maravilhas é um livro para crianças e para adultos. As crianças reveem-se num imaginário louco onde tudo pode acontecer e os adultos interpretam o non-sense e o absurdo como uma maneira inteligente do autor - matemático e filósofo - transmitir mensagens várias. Os diálogos entre os personagens parecem ter sempre duplos sentidos e um dos meus preferidos é quando Alice encontra o Gato Cheshire e lhe pergunta qual é o caminho que deve escolher. Este responde-lhe que isso dependerá para onde ela quererá ir. Alice não sabe para onde quer ir, nem acredita que faça muita diferença porque tudo é uma loucura naquele sítio. Então o gato responde sabiamente, que nesse caso, é indiferente o caminho que ela escolher. Será que também nós chegámos a um mundo alienado onde tudo pode acontecer e por isso é indiferente o caminho que tomarmos?

Um dos grandes objetivos dos sistemas políticos é proporcionar condições para que os seus cidadãos tenham uma "vida boa" (no sentido Aristotélico) e apostar no crescimento económico foi considerado como a melhor maneira de a atingir. Mas, a certa altura, o crescimento económico deixou de ser um meio para atingir um objetivo e passou a ser o objetivo em si mesmo. Perdemo-nos fascinados no país das maravilhas e andamos loucos como os seus personagens atrás dum propósito único.

Crescer é certamente um objetivo válido pois muitos dos critérios com os quais identificamos a "vida boa" são dessa forma cumpridos. Só que não a substitui totalmente e acarreta custos a vários níveis, nomeadamente pessoal e ambiental. Nos últimos anos uma série de estudos demonstraram que a relação entre crescimento económico e felicidade não é tão linear e óbvia como pensávamos e os impactes ambientais têm vindo a manifestar-se como insustentáveis para o nosso planeta.

Mas prosseguimos no caminho de aumentar a produção e o consumo como se esse fosse o único possível rumo. Tendemos a ignorar que os recursos naturais são finitos e que a degradação dos ecossistemas naturais e os impactes das alterações climáticas não auguram nada de bom. Mas quando questionamos o crescimento económico apercebemo-nos que estamos perante um dilema: apesar do crescimento económico debilitar o ambiente, não crescer economicamente debilita o estado social (criando desemprego e instabilidades várias). É um dilema mais difícil de resolver do que as várias advinhas que Lewis Carroll tanto gosta no seu livro, até porque inclui outras dimensões também importantes. Mas no fundo até agora temos apostado essencialmente no crescimento económico e investido na minimização dos seus impactes ambientais. Vários indicadores, nomeadamente o da pegada ecológica, dizem-nos que não tem sido uma aposta ganha na dimensão ambiental. A atual crise (mundial) financeira e económica também não nos assegura que a dimensão económica tenha funcionado. Finalmente, a fome no mundo, a pobreza e as brutais desigualdades existentes também não nos fazem crer que estejemos no verdadeiro bom caminho.

Quando não conseguimos ver uma saída para determinado problema, em vez de ficarmos no mesmo sítio à procura de uma solução inexistente, o melhor é mudar de lugar. Apostar no estado estacionário* ou mesmo no decrescimento económico** e investir em minimizar os impactes sociais daí decorrentes é uma hipótese válida?

Como manter empregos, direitos adquiridos, um estado social (educação, saúde, apoio à terceira idade e desfavorecidos) e mesmo proteção ambiental sem crescimento económico? E seríamos mais felizes? É certamente um árduo repto mas enquanto não o estudarmos a sério nunca vamos saber a resposta. Já existem vários movimentos e autores***, principalmente no meio académico, que o estão a fazer mas ainda sem qualquer ressonância no mundo político ou mesmo na sociedade civil. Alice mudava de estatura conforme melhor lhe convinha; ora comia uma determinada parte do cogumelo e crescia, ora comia outra e ficava pequena. Nós não temos esse cogumelo mágico por isso temos que começar a estudar como e se poderemos mudar de paradigma, de sistema, de instituições, de tecnologias para sabermos se é para aí que queremos ir. Só depois de o sabermos, o gato Cheshire nos poderá a ajudar a escolher o caminho certo.


IN "VISÃO"
08/02/11

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